quinta-feira, janeiro 03, 2008



Eu não quero ser vítima do mundo, o meu pequeno e egocêntrico mundo. Filha de Deus, de olhos negros de dor e secos de fome de amor.
Quero morrer sorrindo. andando pelos meus próprios passos. Quero tudo o que posso ter sem me preocupar se é arriscado, doloroso ou difícil.
Quero a morfina da madrugada onde meu espírito não se lamente pela solidão. E o grito iminente, quero é largá-lo. Aos berros, quero gritar as minhas dores que nessa temporada quase me matam. Quase! E no quase ainda estou viva. De roupas negras num luto que não passa. Que ainda haja fôlego para mais essa longa caminhada. O tempo anda de brincadeira comigo, cara de palhaça. E no fim, nada disso vai importar. Porque sentimentos morrem de parada cardíaca, desaparecendo na minha própria escuridão. Vou me esquecer dos meus deuses que passaram despercebidos, sem me guiarem para aquele meu destino. E agora estou me esquecendo de algo. Algo que era belo e me fez sorrir, meu sorriso sem dor...
Não! gritei-me de súbito, acordando a mim mesma com minha voz rouca. Recuso-me a ser novamente a vítima indignada e magoada. Que minhas dores, que são minhas e somente minhas, que minhas dores me abram ao meio me rasgando do peito essas lembranças ruins. Mas estou tão cansada desses meus eus, que não se calam e se açoitam e choram feito bebê grande, apenas para não morrerem dessa morte lenta. Mas ainda há borboletas aqui. de asas vermelhas, me rondando como se fosse flor carente. Sozinha nesse jardim imenso...

Renata Lôbo

Um comentário:

Anônimo disse...

Um belo exemplo de poesia em parágrafos e não em estrofes. Pode não haver rima, mas a escolha das palavras dá uma musicalidade tão suave, sempre mantendo o ritmo. E desenvolve, desenvolve, para um final súbito, como o cair em um abismo.
Enfim... Muitas vezes não se está tão sozinha quanto o que imagina. Há a diferença entre aquilo que se vê ou as coisas que apenas se sentem...