quarta-feira, outubro 27, 2010

Segredos, tenho aos montes, escorrendo de presas afiadas como veneno ácido.
Matando o bom e o mau em mim.
Falta de conectividade, sabe como é?
Quem entrasse aqui ficaria perdido com tantas portas fechadas, tantos compartimentos secretos e tantas histórias guardadas.
Se soubesse, seria diferente. Mas se entendesse, entenderia tudo errado. Duplo sentido do mesmo quebra-cabeça. E que se dane todo o resto, vou pintar meu quarto de vermelho e acordar com o sol pegando fogo. Poesia. É tudo que eu tenho. E cartas não-enviadas. E sonhos moribundos. E palavras não-ditas. Promessas não-cumpridas. Um monte de coisa para vomitar por dentro e escorrer em veias abertas e fechadas. Cicatrizes de nuvens e tempestade interna. Apagando um pouco. Queimando um pouco.
Não há ninguém em casa.

Renata Lôbo

terça-feira, outubro 26, 2010


Não me perca que tenho medo de cair.
Renata Lôbo

domingo, outubro 24, 2010

Um Segredo


Porque eu queria palavras que me dissessem, que te dissessem, olha, foi assim que aconteceu. Mas esse é um segredo só meu. De tempos remotos e sorrisos secretos. Te trago aprisionado aqui, sem contar para ninguém. Sem me dizer e sem te dizer. Minha vida é repleta de coisas não-ditas e sonhos subentendidos. Te guardei entre eles. Nenhuma palavra vai explicar com exatidão, com pontos certos e vírgulas cortadas. Nenhum rosto vai me ver quando sua falta me aquece. Nenhuma voz vai me alcançar murmurando promessas de futuro bom pós-coração-partido. Não deixo. Minhas fraquezas me consomem e um dia, ao sair da cama, não terá restado nada, e ninguém poderá entender o que exatamente ficou. Restos no lixo, pedaços picados de uma história secreta. Você foi meu. Mas não foi suficiente. Um cego tentaria entender entre palavras comidas a verdadeira face da verdade. Um cego enxergaria essa história carcomida e vomitada entre sonhos esquecidos e promessas mal contadas. O resultado disso tudo é, talvez... outro segredo. Que não conto para não me assustar. Que não conto... Perdida no espaço ignorante de sentimentos que não quero e lembranças que não procuro. Vou viver meu dia agora, minha vida agora... Que amanhã é outro entardecer muito mais vermelho, muito mais meu. Sem futuros vazios.
Palavras de ninguém vão explicar o que aconteceu. Palavras de ninguém vão explicar quem eu sou, porque isso também é segredo que você simplesmente desperdiçou.
Já chega, né? Porque estou cansada de me doer, de não me querer, nada aqui. Cansada de ser a última nessa história mal terminada com verbos incorretos e passados amedrontados. Estou cansada de sonhos inúteis... Te guardo em segredo porque é só assim que sei te ser.

Renata Lôbo

sábado, outubro 23, 2010

Mil sonhos.


No canto escuro da noite, os sonhos se misturam, e a nuvem tóxica aparece como um convidado incômodo. Apenas para dizer oi!
Papai do Céu, me perdoa! Eu não sei o que fazer de mim!
Mesmo que as estrelas desabassem, mesmo que fosse sempre noite, e o sol queimasse mil eras, mil papéis... sonhos coloridos e bolhas de cristais.
A criança olha o céu cor de rosa e sorri.
À beira das lágrimas vive um sorriso maroto que quase sabe do que foi feito, mas mil caminhos sutis abrem alas aos pesadelos mansos. Quero uma gaivota que cative meu coração com cuidado para que ele não se quebre de novo. Quero um pedaço de sonho para guardar no fundo da gaveta e acreditar que o que quer que trago aqui, não significa o fim, nem o começo, nem a dor.
Dias nublados.
À beira das lágrimas mora um poço sem fim e sem razão chora melancolias perdidas de uma idade já avançada. Quero enterrar meu mundo e aspirar mil canções como hino fúnebre, de peito aberto e coração ensanguentado. Nunca curado. Nunca salvo. Nunca manso. Nunca deixado.
Quero gritar mil vozes, mil letras, mil sonhos partidos em porcelana fina. Pátria de mim, me aceite assim, cuspindo flores e engolindo espinhos.
Estou subindo escadas que não me levam a lugar nenhum, subindo ou descendo, já nem sei. Pulsos marcados e vermelhos-escuridão como sonhos alternados. Me pegue enquanto caio. Me pegue porque caio. No silêncio, na noite, no vazio, no frio. Alma-minha, Minha-alma.
Estava sem forças e alarmes soavam docemente como uma sirene mal interpretada. Não era o fim. Não era nada. Doces mentiras disfarçadas de sorrisos fortes como café pela manhã e migalhas de pão velho à noite. Cigarras brigando por um pouco de atenção. Dores avançadas. Espumas mortas à beira-mar, à beira-praia, à beira-lágrima.
Muito pensamento faz sangrar o coração.

Renata Lôbo