domingo, dezembro 09, 2012

Era uma vez.


Era uma vez uma história que nunca foi contada. Não que não fosse importante, era de fato estranho que ninguém a notasse, mas a história estava escondida e assustada com medo de seus algozes imaginários. Era uma vez um pedaço de Verão costurado no Outono com um pezinho no Inverno que invejava a Primavera. Essa não é a história esquecida, é só uma história que também não foi contada. Se o destino dependesse desses pedaços de tempo perdidos entre uma sobremesa e outra, talvez tudo fosse diferente. Mas não era bem assim. Uma história perdida e uma história esquecida. Era uma vez uma amizade impossível entre situações que nem existiram. Era uma vez uma palavra perdida entre os muros do silêncio. Esses muros vorazes que matam sentimentos de solidão e chamam o eco para ser carrasco. Eco, faça companhia a essas palavras malditas! Os muros do silêncio não gostam de  desobediência. Era uma vez uma palavra insistente que não se cansava de ouvir o eco que ninguém respondia. Uma palavra que fingia solidão e adormecia na calada do silêncio, não da noite, porque a noite ainda era uma aliada. Ideias tumultuadas vinham espiar sonhos desvanecidos. Era uma vez uma situação tão inusitada que o impossível fez questão de virar as costas. Era uma vez um sonho colorido com papel machê, água salgada e aurora amanhecida. Consegue ver esse mundo que  ninguém te conta, não por medo, mas por necessidade? Era uma vez uma gota de água perdida no Oceano em busca de outra gota de água, que decidiu se tornar chuva para chorar suas tristezas sem fim. Suicida! Diziam. Mas era algo mais, e nem era tão simples. Era uma vez a roda do destino brincando de dona aranha. Aquela que cai. Aquela que não desiste. Era uma vez um pedido de desculpas entalado na garganta rouca. Aquele pedido que ninguém nunca escutou e nunca vai escutar. Seu dono morreu por excesso de palavras entaladas. Um mal existente, sinto informar. Um mal persistente. Sinto não dizer. Era uma vez um sorriso perdido. Um olhar escondido. E um amor não vivido. Mas isso tem aos montes. Eles se amontoam nas calçadas esperando uma chance, esperando que alguém não olhe para o outro lado com indiferença azeda. Esperando que alguém tropece naquela história não contada, daquele verão que vinha na frente trazendo seus irmãos a tiracolo, que alguém tropeçasse naquela palavra que não foi ouvida, naquilo que de tão impossível tinha cores imaginárias, naquela gota de lágrima que se fingiu de Oceano para virar chuva. Eles continuam lá na esperança de que alguém tenha coragem de dizer as palavras não ditas para que ninguém nunca mais morresse desse mal. Era uma vez a esperança, que de tanta espera, se apagou. Um céu cinza picotado de neve negra. Mas não era uma história triste, acredite em mim. Não era absolutamente coisa nenhuma, nada. Talvez isso seja o triste nessa história, como uma tela branca à espera de tinta. Como um papel virgem à espera da metamorfose da carta. Aquela carta que ninguém nunca escreveu. Aquela carta que também matou seu dono. Por excesso de zelo. Por medo. Talvez seja uma história triste. Talvez o mundo esteja acabando. Mas tudo começou com aquele pedaço de história. Aquele pedaço de história que foi esquecido e nunca contado. Por favor, conte sobre essa história para que o peso em seus ombros não te esmague, não te sufoque, não te afogue. Essa é uma corrente. Não. Não é coisa nenhuma. Como essa história que nunca foi lembrada, esse é um pedido que nunca foi feito. Era uma vez uma noite azul. Finge que estou te contando a história, porque a solidão está matando essas palavras aos poucos. Essas palavras que de tão não ditas tornaram-se malditas. Talvez seja realmente uma corrente. Talvez o sono esteja embaralhando essa mente e mentindo outra história, outras palavras, outra vida. Talvez não seja nada disso. O problema é que era uma vez algo que nunca foi dito. E isso era importante. Isso era realmente tudo.