domingo, fevereiro 17, 2013

Picasso Suicida - trecho


 "Acordou se sentindo mais fraca. A noite foi longa. Brigou mais uma vez com o marido que saiu de casa batendo as portas, dormiu fora. Deve estar no escritório. Não houve muitas situações como essa, nunca tinham perdido o controle dessa forma. Karina sempre achou que essa fosse a força do casamento: a união que tinham parecia inquebrável. Só agora percebia que não havia união alguma, que ambos nem se conheciam há muito tempo. Foi com esse pensamento que adormeceu. Agora ela de alguma maneira conseguia enxergar essa verdade dura. Haviam se afastado. "Porque? Quando?" Teria sido por causa da morte de Carolina. A morte. Pensou quanto tempo mais teria pesadelos e por quanto tempo mais a vida continuaria tão pelo avesso. Quanto tempo duraria essa crise? Enquanto se encaminhava para a mesa, a fim de tomar o café da manhã como todos os dias fazia, passou pela porta do quarto da filha que continuava fechada. Desde o ocorrido não sentiu vontade e nem teve coragem para entrar. Os empregados que arrumaram tudo. Receberam ordens de Caio - que nessas horas parecia muito sensato e maduro - receberam ordens para apenas limpar e arrumar o quarto, como se nada houvesse acontecido. Quando Karina lhe disse que seria inútil e que o melhor seria se desfazer de tudo, desde as roupas aos cds e livros, Caio, com o olhar duro, disse apenas: "Você não vai conseguir isso se não entender." Perguntava-se constantemente o que ele queria dizer com isso. Uma semana depois Caio viajou de férias para a casa da mãe A empregada que encontrou Carolina caída no chão naquela noite horrenda, demitiu-se e saiu do serviço no mesmo dia em que Caio viajara. "Ele bem que queria se demitir também" disse para si mesma. "Se pudéssemos nos demitir da vida que levamos..." Suspirou delicada e se preparou para enfrentar mais um dia, sozinha. "

Renata Lôbo