Me dê espaço e eu fujo. Fujo, como fujo das coisas que me impedem de fugir.
Fujo sem remorso, te deixo caído na esquina, e não me importo se está ferido ou sangrando. Ah, meu amor, como me dói não me importar com você, justo você, amigo íntimo da alma minha. Alma conflituosa divagando pela Terra, sozinha, dia e noite e na imensidão desse coração maltratado, quebrantado.
Mas me deixe, me dê esse espaço que te imploro tanto, e eu irei pela porta da frente, e a deixarei aberta para que o vento te leve meu cheiro. Te faço torturas junto com essas juras tão fugazes...
e me amas ainda, terno e paciente, ou será que não vê? Não nota meu desespero para me libertar da sua presença forte e quente e calma? Não vê que por amor a ti, não te quero, não te amo?!
... Não me importo. Não me importo com teu sangue, com tua carne, e dela me alimento mais, me sacio, e dela me desejas, amargo, me anseias. Te diria então, sem amor nenhum em mim, te diria que não te quero, não me quero, não nos quero. Meu olho dentro, afogado no teu. E você me olharia com esses mesmos olhos que conheço tão bem e me abraçaria forte, tenatando matar qualquer coisa em mim que não sei, não conheço, tentando acalmar aquilo que vê em meus olhos escuros como noite fria, sem lua. Acalmasse aquilo que vê em meus olhos, tempestade, mar em fúria, revolto, arisco, tempestade que destrói embarcações inteiras com marinheiros desprevenidos e cheios de coragem tola. Tempestade que afoga e não me mata. E eu te afastaria de mim, áspera, toda dolorida, e você me beijaria, apaixonado, ardente, todo dolorido. E eu não te diria nada, mergulharia no silêncio que há entre nós, te expulsando de dentro de mim. Ficaríamos assim: quietos, compreendidos, com o silêncio que nos transpõe, desde os tempo remotos. Você, todo machucado e alegre, mas não sei viver com gente alegre, e eu não saberia o que dizer nesse momento, mesmo porque... Ah, meu amor, mas eu tenho medo de me cortar e de te cortar com essas minhas palavras agudas e cruéis, e meu beijo seria amargo como planta venenosa entre as flores azuis e sem espinhos. E te imploraria, sôfrega, sem ar por dentro, toda em desespero, te imploraria que me deixasse ir.
Me dê espaço meu amor, pois a tempestade já vem.
Renata Lôbo